Mensagem de um velhinho

domingo, 18 de setembro de 2011

FAZ HOJE PRECISAMNETE 41 ANOS QUE EU EMBARQUEI PARA A GUERRA NA GUINÉ. !




Foi na manhã do dia 18 de SETEMBRO do ANO de 1970, FAZ HOJE 41 ANOS, que eu embarquei em Lisboa no cais de Alcântara a caminho da GUERRA na Guiné , abordo do navio ANA MAFALDA.
O ano de construção do referido navio Ana Mafalda como um Cargueiro de Mercadorias foi em 1951.
Posteriormente por razões do inicio da Guerra Colonial, foi adaptado à pressa no ano de 1963 para poder transportar 52 soldados de cada vez para a Guerra na Guiné até 1972, tendo sido abatido em 1975.
Tinha 103 metros de comprimento, 14 metros de largura, e dava uma velocidade máxima de 13,5 nós, ou seja, atingia a grande velocidade de 25km por hora. Tinha 16 alojamentos em primeira classe, 24 em segunda e 12 em terceira para transportar 52 passageiro e tinha 47 tripulantes. Total=99 pessoas.

Na hora do embarque, os oficiais foram distribuídos pelos beliches dos "camarotes", o SOLDADO, como de costume nestas e noutras situações, foi mandado para o porão, amontoados como sardinhas em lata, onde não se conseguia respirar e estavam montados uns beliches de ferro com umas enxergas em cima, e onde casa de banho não havia.

Foi uma bela viagem, como devem calcular, com os baldes dos dejectos do porão a serem despejados borda fora de manhã e ao fim da tarde. Eu, pessoalmente também enjoei e de que maneira.
Recordo-me que, mais ou menos dois ou três dias depois de termos partido de Lisboa já em alto mar, durante a madrugada uns jogavam a vermelhinha, outros escreviam cartas à família, outros enjoados vomitavam, e, um ou outro estaria a dormir, quando as sirenes do barco começaram a roncar, porque havia incêndio no compartimento das máquinas que faziam mover o barco. Toca a levantar a toda a pressa, não houve tempo para calçar nem vestir, agarrar os coletes salva vidas para a eventualidade de termos de nos atirar ao mar, e fomos evacuados a toda a pressa para a proa do navio, pois havia fumo por todos os lados.
Era noite escura, só se conseguia ver estrelas no céu e ouvia-se a água a bater no casco do barco! Foi um daqueles sustos que mesmo aos 22 anos de idade deixam marcas para o resto da vida. Ainda hoje não gosto de andar de barco! Estivemos quase a noite inteira parados em alto mar até ser reparada a máquina que tinha ficado danificada com o incêndio, depois lá continuamos a viagem até à Guiné, chegando e atracando em Bissau na manhã do dia 24 de Setembro de 1970.

1 comentário:

Maria de Lurdes Campelo de Sousa Rodrigues disse...

As tuas memórias, querido irmão,são notícias tristes que eu nunca ouvi. Passadas mais de quatro décadas, sei então, que tua viagem para a guerra teve tantos atropelos pelo meio!!!... para além de que os "cães grandes", o que já não é novidade para mim, onde quer que estejam ou para onde quer que vão, têm sempre aposentos e dormitórios diferentes daqueles, para onde vão os homens sem galões. Fala-se tanto de racismo e diz-se que não se deve discriminar as pessoas, mas o que é certo é que no coração dos que nos lideram ou são superiores, existe essa atitude discriminatória. Por isso é que os espaços entre si não são comuns e a comida e o relacionamento são diferentes.
É uma tristeza que a nossa sociedade se distribua assim: em patamares.
Mas, desde sempre houve desníveis sociais e não hão-de ser os que lutam pela igualdade, que vão modificá-los.
Muito entristecida e aflita, com o episódio que viveste enquanto guerreiro, ficaria nossa mãe, sentindo na sua carne as tuas atribulações.
Faço aqui uma alusão à casa em ruínas onde nasceste, aliás, onde todos nascemos. Gostei de ver o parcial "esqueleto" que nos lembra a nossa origem e gostei de ouvir a música de fundo com o cilrear dos passarinhos.
Parabéns e beijinhos - tua mana Lurdes